“Se queremos dizer como desejamos que nossos filhos
sejam educados, devemos dizer sem vacilação: queremos que se eduquem no
espírito de Che! Se queremos um modelo de homem, um modelo de homem que
não pertence a este tempo, um modelo de homem que pertence ao futuro, de
coração digo que esse modelo, sem uma só mancha em sua conduta, sem uma só
mancha em suas atitudes, sem uma só mancha em sua atuação, esse modelo é
Che! Se queremos expressar como desejamos que sejam nossos filhos, devemos
dizer com todo o coração de veementes revolucionários: queremos que sejam
como Che!”. (Fidel Castro em 18/10/1967 ao anunciar
a morte de Che).
Quando garoto me encantei com o barbudo Fidel Castro, uma
espécie de macho mais macho que o Leonel Brizola, a quem admirava, mas que não
segurava o império norte-americano pelo saco como fazia o cubano. Apenas muito
tempo depois soube que Fidel tivera um companheiro importantíssimo, um
argentino chamado Ernesto, El Che.
O Che para mim era uma espécie de Rodrigo Cambará
real, e com mais conhecimento sobre esse ator da história contemporâneo latino-americano
mais se tornava insuportavelmente sobre-humano, admirável e nobre, como apenas
os melhores homens o são, e como bem poucos serão. Esqueci Che por anos, pois
sua correção me tornava deprimido. Hoje não, apenas sei, num lamento, que ele
nunca me escolheria para lutar ao seu lado na Bolívia.
Che morreu em 1967 e desde então é uma referencia a
quem vários se dedicam a apagar, como a revista Veja.
Em 1997 foi publicada uma reportagem de Dorrit
Harazim sobre o homem que saiu da vida para entrar na história ao esposar
valores como amor ao próximo e justiça social, é claro que, como todo rebelde
com causa, a custa de fuzil. A jornalista Dorrit pouco entendia de jornalismo,
mas sua inquietude curiosa e insatisfação com as coisas prontas levaram Mino
Carta a recrutá-la para Veja nos anos 60. Certamente que, trinta anos depois
ainda conservava muito da contracultura dos anos rebeldes em si e, então,
partiu para Bolívia, caminhou pelas trilhas, pelas quebradas, conversou com as
pessoas, levantou documentos, a história, e escreveu a reportagem “O triunfo
final de Che”.
Em 2007 a Veja resolveu “comemorar” a efeméride com
“Che: Há quarenta anos morria o homem e nascia a farsa”, dos jornalistas Diogo
Schelp e Duda Teixeira, jovens recrutados como trainees pela revista e que para
evitarem a fadiga apenas mandaram e-mails a fontes anti-castristas da Flórida.
Acabaram repetindo bobagens e levaram esporro do especialista em Che, o ianque
Jon Lee Anderson, e, se vingaram do homem com um “você nunca mais será citado
nas páginas da Veja”. Feio para os
garotos, mas deve ter agradado ao patrão, que nos anos 90 fazia matérias
favoráveis ao MST e outros movimentos sociais, mas que nos anos 2000
criminalizou a todos.
De qualquer forma, apesar dos bloqueios culturais e
institucionais de tratar de temas como latinidade americana, vez ou outra, algum
brasileiro se põe a escrever sobre Che, como o jornalista Saulo Gomes no livro
“Quem matou Che Guevara – O seu delator estava no Brasil”.
A história é que o boliviano Juan Alex Aldunati,
estudante de Direito, enviado de Che ao Brasil o delatou. Segundo Saulo Gomes,
o boliviano havia furtado uma caixa de ferramentas do vizinho, amigo de um
escrivão do DOPS, que, se recusou a dar uma dura no boliviano, pois o caso era crime comum e não político, mas, mesmo assim, encaminhou o ladrão a
delegacia, e isso o assustou, o levando a dizer que não roubara e sim
"expropriara" a caixa com as ferramentas. Assim, diante da palavra
“revolucionária”, a polícia quis saber mais e o estudante Aldunati abriu o
jogo: Che estava na Bolívia.
Curiosamente, na mesma época passava por Cuiabá um
homem alto, pele clara, cabelos escuros, pouco sorriso, voz de comando, com
leve sotaque castelhano procurando Carlos Jorge Reiners, o notório comunista
pantaneiro que fora preso e torturado pelo Exército. Mas ninguém deu
importância aquele estrangeiro que usava um agasalho pesado, e procurava
justamente o inimigo do Golpe de 64, talvez por que naquele dia fazia muito frio em
Cuiabá, e cuiabano não pensa no frio. O que o homem queria de Reiners, e negou
que fosse o Che, eram informações da região, como a “guerrilha de Guiratinga”.
A história de Saulo Gomes, de o delator ser um
destemperado boliviano não faz sentido. Che escolhia bem os amigos e muito mais
os seus companheiros. A coisa não faz sentido, tanto que e o jornalista nem se
detém nela, apenas a usa para sustentar o título do livro porque, de resto, vai
até a Bolívia tão somente ouvir o oficial que capturou Che, o general Gary Prado Salmón. O militar
boliviano é o que se sabe, um cavalheiro, tanto que tratou bem os prisioneiros,
e após ver o cadáver de Che amarrou um lenço em seu maxilar para não deformar
seu rosto. Como todo oficial, e cavalheiro, teria se recusado a vil e infame
tarefa de executar os prisioneiros por ser “soldado e não carrasco”, cabendo a
incumbência ao sargento Mário Terán Salazar.
Um comentário:
Palmas ao autor! Adorei o blog, dos textos as biografias sem edições passando pelos comentários colaborativos! Virei leitor, pq a vida tá difícil com a Unanimidade Burra! Abraços, W.
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